PERIPÉCIAS DE EVALDO
CABRAL
Rachel Bertol
O historiador Evaldo Cabral de Mello,
recifense nascido em 1936, é em geral avesso a entrevistas. No entanto,
numa tarde encoberta do inverno carioca, aceitou passar horas conversando
com o Prosa & Verso na sede da editora Topbooks, no Centro do Rio.
Foi um presente, raro, para os leitores. Um de nossos maiores historiadores,
gigante em seu ofício, este diplomata aposentado discorreu sobre
seus projetos, o Brasil e seus vícios, os desafios da profissão
de historiador, as muitas pessoas com quem conviveu, no Itamaraty
e na família — é, por acaso, irmão do poeta João Cabral de Melo
Neto e primo de Gilberto Freyre. Em sua singular obra, Evaldo destrinchou
como ninguém o Brasil Holandês, no século XVII, numa série de três
livros, dos quais o terceiro — “O negócio do Brasil” (Topbooks)
— foi relançado este ano em edição revista. Outro clássico seu,
“Na fronda dos mazombos — Nobres contra mascates, Pernambuco, 1666-1715”
(editora 34), acaba de chegar às livrarias, também totalmente revisto.
No momento, o historiador se dedica à redação deste que, avisa,
vai ser seu último livro, sobre o período da Independência. Será
mais uma obra de muitas peripécias, pois Evaldo gosta muito delas.
“Os historiadores perderam a noção do que constitui a reserva de
mercado da História, que é a peripécia”, critica ele. Para contar
a História, na sua opinião, nunca se deve perder de vista a dimensão
narrativa, levando em conta as peripécias dos homens e toda a contingência
da vida, a fim de concatenar as séries de acontecimentos no tempo.
Sem isso, alerta ele, o trabalho de História corre o risco de ficar
igual a um de sociologia ou economia, só que relativo ao passado.
A seguir, trechos da conversa.
“O NEGÓCIO DO BRASIL”: “Fiz uma
revisão de estilo e acrescentei alguns elementos. É um livro cuja
bibliografia é muito difícil de se achar no Brasil. Para surpresa
minha, encontrei livros que nunca pensei que encontraria na biblioteca
do Itamaraty, aqui no Rio. Esse livro tinha sido mal interpretado.
Por causa do acordo diplomático entre Portugal e Holanda, para a
devolução do Nordeste, e por causa da indenização paga por Portugal,
ficou-se com a idéia de que a guerra não tinha causado a expulsão
dos holandeses. Ora, isso não existe. A negociação diplomática não
se faz no vácuo. Ela só foi possível porque houve uma guerra que
os holandeses não conseguiram vencer. Mas, mesmo ganhando a guerra
no terreno, Portugal era muito vulnerável e tinha de entrar num
acordo. Quando a Holanda viu que não queria mais perder dinheiro
tentando recuperar o Brasil, ela simplesmente bloqueou a Barra de
Lisboa e se apossou de um comboio de navios que vinham do Brasil.
Por isso, Portugal precisava da proteção de uma grande potência
naval, que foi a Inglaterra. Todo esse assunto não tinha sido objeto
de um livro completo”.
PADRE ANTONIO VIEIRA: “Vieira exagerou
a importância da atuação que teve. Sobretudo quando não conseguiu
vender a idéia da entrega do Nordeste aos holandeses, ele começou
a tirar o corpo fora e dizer que não era tão responsável assim,
que a idéia tinha sido do rei, e que ele tinha sido apenas um executor,
quando se vê que antes dessa negociação ele já tinha essa idéia,
de que a solução do problema era entregar o Nordeste. Mas ele enfrentou
a oposição dos valentões, os portugueses que não aceitavam a entrega
do Nordeste”.
O FUTURO DA HISTÓRIA: “Não sou contra
a interdisciplinaridade, mas contra a orgia. O que se dá hoje é
uma orgia das ciências humanas. Os historiadores perderam a noção
do que constitui a reserva de mercado da História, que é a peripécia.
Aliás, é uma palavra que está em Aristóteles. A interdisciplinaridade
é importante, porque permite ao historiador enriquecer sua capacidade
de concatenação. Mas, se você começa a abandonar essa dimensão,
torna o trabalho de História quase igual ao de sociologia ou economia,
só que relativo ao passado. A influência da antropologia na história,
por exemplo, tem sido devastadora, porque o antropólogo pensa exatamente
de maneira oposta ao historiador. O antropólogo, quando chega numa
sociedade primitiva, não dispõe de arquivo ou bibliografia. Ele
descreve as práticas — matrimoniais, de higiene — mas não tem como
entrar na dimensão histórica. Procurei retomar a dimensão narrativa,
porque o específico da História é a capacidade de concatenar no
tempo uma série de acontecimentos. Esse problema não é apenas literário,
de apresentar algo mais atraente ao leitor. Se alguma História nova
surgir nos próximos anos, ela será voltada de novo para a necessidade
de reconstituir seqüências cronológicas e de eventos, agora enriquecidas
pelo aporte da sociologia e das outras ciências humanas”.
CONTINGÊNCIA: “Com a contribuição
das outras ciências humanas, o historiador tendeu a perder a noção
da contingência em História. É uma noção muito difícil para ele,
porque é um sujeito de gabinete, sempre à procura das forças profundas
da História. Evidentemente, também desempenham um grande papel forças
menos profundas, superficiais. É preciso se concentrar um pouco
nas vicissitudes, nas peripécias que os homens encontraram no decorrer
de sua atuação. Eram pessoas com determinados objetivos e isso é
de uma riqueza enorme, porque havia outras pessoas com objetivos
opostos. Um livro admirável, nesse aspecto, é o de Sergio Buarque
de Holanda sobre Império e República, porque ele faz uma narrativa
exatamente política em que a interferência das chamadas forças profundas
é mínima”.
JOÃO CABRAL DE MELO NETO: “João
era 16 anos mais velho do que eu. Quando ele veio para o Rio, eu
tinha 6 anos. No fundo, convivi pouco com João, que só voltou ao
Recife 11 anos depois. Cheguei a passar férias na casa dele no Rio,
mas logo ele foi para o exterior. Então eu só o via esporadicamente.
Quando estudei na Espanha, fiquei um mês na casa dele e, no período
em que éramos diplomatas, os dois, eu nunca tive um posto com ele.
Estávamos sempre muito longe. Eu na Europa, ele na África... Mas
eu não tinha, especialmente, afinidade com o João. Sou uma pessoa
mais moderada, mais comedida. João era obsessivo. Pessoalmente,
era muito cansativo, difícil. A primeira mulher dele era uma santa.
João era uma pessoa conflitada, acordava e dormia assim. E havia
um elemento de exagero. Ele se incendiava. Sob esse aspecto, de
se infernizar, eu tinha muita tendência a me infernizar quando eu
estava na carreira ativa do Itamaraty. Eu detestava aquilo e não
sabia”.
PERNAMBUCO E JOÃO: “Devo dizer que
me converti a Pernambuco antes de João. Não tenha a menor dúvida,
por uma razão muito simples. Embora eu seja 16 anos mais moço, João
só começou a falar de Pernambuco, se não me engano, em ‘Cão sem
plumas’, de 1950. Nesse época, eu já estava mergulhado na História
de Pernambuco. Numa palestra na Casa de Rui Barbosa, contei coisas
específicas da poesia dele. Há uma série de alusões na obra dele
que só eu e minha irmã — éramos seis irmãos, mas já morreram todos
— somos os últimos capazes de entender, inclusive de natureza familiar.
Por exemplo, a referência que ele faz num verso a “um tio de texto”,
que se chamava João Cabral de Mello Filho. Quando era meninote,
uma vez João encontrou lá perto de casa uma calçada de cimento recém-feita
e escreveu ‘João Cabral de Melo passou por aqui’. Tio João passou
horas depois por ali, viu aquilo e ficou danado. Ele era juiz de
direito, foi desembargador... Ele e João sempre se estranharam muito”.
GILBERTO FREYRE: “Devo dizer que
sempre fui uma pessoa desencantada com o gênero humano. Quando tinha
14, 15 anos, freqüentava muito a casa de Gilberto Freyre, que era
primo de mamãe. Gilberto, nesse sentido, foi uma influência decisiva,
embora eu hoje não sinta muita identificação — aliás, nunca senti
identificação com as idéias dele, a não ser nesse período em que
eu era muito jovem. Mas eu também era muito decepcionado com Gilberto
como pessoa, devido à vaidade dele, que era muito grande. Tendo
essa experiência, eu perdi a vontade de conhecer grandes escritores.
E parti do princípio de que o melhor dos escritores está no que
eles escrevem. Querer conhecê-los pessoalmente é uma falta de tempo.
Certa vez, em Paris, me disseram que Braudel gostaria que eu o visitasse,
mas eu nunca fui. Ele ia me escutar, porque era uma pessoa muito
generosa e gregária, o que eu não sou, mas de que ia me adiantar
uma meia hora com ele? O essencial eu já tinha aprendido nos seus
livros”.
O MITO DA IDENTIDADE NACIONAL: “Esse
é o tal negócio: o Brasil inventou, a partir do modernismo, com
‘Macunaíma’, com base em determinados elementos da realidade brasileira,
essa identidade nacional. Mas isso é, na verdade, uma criação. Não
há identidade nenhuma, há uma criação, como uma invenção literária,
uma invenção em matéria de idéias. O problema também é que — isso
você pode pôr para chatear os cariocas — essa história de caráter
nacional brasileiro é uma besteirada. Não sei como o gaúcho vai
se rever no mito do malandro carioca. Nós somos todos provincianos
— paulista, cearense, gaúcho, paranaense, inclusive carioca. Mas
o carioca é o único brasileiro que se acha cosmopolita. É muito
provinciana a maneira como os cariocas se referem ao Rio, como se
fosse a oitava maravilha do mundo, e com esses problemas todos.
O carioca é muito imaginoso”.
JOSÉ GUILHERME MERQUIOR: “Eu tinha
a consciência pesada em relação a Merquior, por isso lhe dediquei
‘O negócio do Brasil’. Não que eu tivesse feito algo contra ele,
ao contrário. Era meu amigo. Mas sou uma pessoa de uma certa secura
emocional. Não tenho derramamentos. E Merquior morreu tão moço,
de maneira tão inesperada, que muitas vezes fiquei pensando cá comigo:
‘Veja como são as coisas. Eu, com essa minha secura, acho que nunca
tive a oportunidade de demonstrar ao Merquior a admiração e o apreço
intelectual que eu tinha por ele’. Lembro que, certa vez, em Lisboa,
ele fez uma conferência brilhante em defesa do governo Sarney —
o que não era propriamente uma tarefa fácil. Pois bem, voltei ao
hotel e me disse: ‘Sou um cavalo, nem o cumprimentei pelo brilho
da conferência’. É por isso que tenho vontade de dedicar meu livro
a Cícero Dias. Só dedico livro a amigos mortos, pois parto do princípio
de que posso vir a brigar com eles. Mas Merquior era de uma atividade
e vitalidade impressionantes. Já eu só fiz essa coisa de escrever
livro na base de muita disciplina”.
GEORGES DUBY: “Tenho horror à universidade.
Dei aula na USP um tempo e achei um negócio altamente desmotivador.
Os estudantes não tinham o menor interesse e eu também os achava
chatos. O grande professor é, no fundo, um grande ator. Georges
Duby foi um ótimo professor que tive, na França. Era impressionante.
Parecia um sujeito da Comédie Française”.
INTUIÇÃO CONCRETA: “Gosto de escrever
livros. O que fica é o livro e sobre isso nunca me equivoquei. Eu
me identifico com o cosmopolitismo — aliás, para mim, cosmopolitismo
são boas livrarias, o que tem muito na Europa e, no Brasil, não
tem — mas sempre achei que um brasileiro só teria chance de se destacar
escrevendo sobre o Brasil. Também não gosto do pensamento abstrato.
Não tenho vocação nenhuma para o pensamento abstrato e confesso
que me chateia muito a abstração. Gosto de concreção”.
TRAJETÓRIA DOS LIVROS: “É bastante
dirigida. O primeiro, ‘Olinda restaurada’ , foi um livro sobre a
guerra holandesa. Mas a guerra no Brasil, no terreno, no Nordeste.
O ‘Rubro veio’ foi sobre o imaginário dessa guerra, o que ficou
no imaginário. E o terceiro é ‘O negócio do Brasil’, sobre o aspecto
internacional da luta. Explorei a guerra holandesa sob três aspectos:
o logístico, no primeiro; o ideológico, no segundo; e, depois, o
internacional. Agora não volto mais ao assunto. ‘O negócio do Brasil’
está sendo traduzido para o holandês e, em Portugal, eles gostaram”.
LIVRO SOBRE A INDEPENDÊNCIA: “Meu
próximo livro é sobre a Independência do Brasil. Não gosto de falar
de livro que estou fazendo, porque posso morrer no meio. Ainda faltam
umas coisas. É um livro sobre o federalismo na Independência. As
pessoas acham que no Brasil o federalismo só começou com o Ato Adicional
de 1834 e depois com a República. É um engano. Houve um movimento
federalista forte durante a Independência. É este movimento que
tento analisar. ‘O federalismo na Independência’, seria este mais
ou menos o subtítulo, ou ‘Federalistas versus unitários’. Os dois
grupos partindo de dois pressupostos completamente opostos. Para
os federalistas, no momento em que o Brasil se tornou independente,
como expressão geográfica, a soberania revertera as províncias.
Cada uma das províncias no Brasil era independente. Esse era o ponto
de vista defendido pelo padre Feijó, em Lisboa, e por Frei Caneca,
em Pernambuco. Isso eram os federalistas. No momento em que achavam
que cada província era independente, tratava-se de entrar num acordo
para se fundar o Império na base de um acordo entre as províncias,
que preservasse um grau de descentralização para garantir a autonomia
provincial. Do outro lado, estavam os unitários, que partiam de
visão completamente oposta. Para eles, o Brasil como nação, e não
como expressão geográfica, preexistia às províncias. De modo que
estas não tinham o direito de se desligar, nem de negociar nada
entre elas. E esta última fórmula foi a que triunfou no Rio, com
dom Pedro, José Bonifácio, etc, que seria revista depois em 1834
e em 1889, na República. Mas já houve um movimento federalista forte
na Independência e este é um aspecto ou completamente ignorado pela
historiografia, ou tratado sem a compreensão do fenômeno, como se
fosse separatismo. Mas o Brasil não existia no tempo da Independência”.
PERNAMBUCO NA INDEPENDÊNCIA: “Sobre
a Independência, não há praticamente documento novo. Os documentos
novos a que estou dando mais ênfase são os que não tinham sido muito
explorados, porque eram relativos à Independência em Pernambuco,
que foi o centro do movimento federalista no Brasil. Peguei inclusive
jornais de Pernambuco daquele período e tive de ir lá. Descobri
uma parte desses jornais na mão de uma senhora, dona Francina Santos,
que tinha herdado da família uma coleção de jornais pernambucanos
do tempo da Independência. Completei a coleção dela com as coleções
da Biblioteca Nacional do Rio. Esses jornais ninguém tinha praticamente
explorado do ponto de vista da História da Independência em Pernambuco,
província que representou o desafio mais frontal ao Rio, obrigado
a mandar tropas para suprimir uma revolução, um governo hostil em
Pernambuco, que foi o governo da Confederação do Equador, com potencial
para incendiar todo o Norte do país”.
A VERSÃO DOS VENCEDORES: “Já antes
das universidades, a historiografia brasileira foi marcada pelo
Rio, a historiografia do Império, da Corte. Os publicistas ligados
aos dois Pedros. Depois houve a historiografia do Instituto Histórico.
Isso não varia, desde Varnhagen, que escreveu a primeira História
da Independência, até a mais recente, que é uma droga, do José Honório
Rodrigues, passando por Tobias Monteiro, Oliveira Lima, Oliveira
Viana, Nabuco. A historiografia do Império parte de uma idéia preconcebida,
de que o Brasil tinha o destino manifesto de ser uma só nação, o
que é um absurdo. Tudo o que não estiver voltado na História da
Independência para a criação do Brasil independente é rejeitado.
Inclusive as tendências federalistas, que foram caluniadas como
separatismo”.
‘A FRONDA DOS MAZOMBOS’: “Escrevi
‘A fronda dos mazombos’, agora reeditado, exatamente sobre o começo
do século XVIII. É sobre a tradição autonomista em Pernambuco, que
vai explicar o federalismo cem anos depois, e sobretudo é um estudo
sobre a rivalidade entre brasileiros e portugueses em Pernambuco.
Tudo isso faz sentido. Pernambuco foi a única parte do país que
foi colonizada durante um quarto de século por uma potência estrangeira,
a Holanda, depois expulsa. É também nessa parte do Brasil que se
desenvolve o nativismo, o antilusitanismo mais violento. Todo mundo
estava de acordo que o ódio ao português no Brasil era sobretudo
forte em Pernambuco”.
O RIGOR: “Considero-me um historiador
universitário, porque fiz sempre tudo com grande rigor de método.
Não sinto, nesse sentido, que haja grande diferença entre o que
faço e o que se faz na universidade, a não ser pela moda. Na universidade,
abandonou-se completamente a técnica da narração histórica. É uma
história puramente descritiva. Sob esse aspecto, eu me sinto afastado.
Por isso, o fenômeno de autores que surgem, apresentando uma história
para um público maior, e que têm êxito. Porque a história feita
pela universidade é só para especialistas. A minha também é para
especialistas, mas lhe dou um caráter narrativo, de modo que a coisa
se torna menos árida que uma tese universitária. O livro sobre a
Independência vai ser o meu último. História é uma coisa muito cansativa.
Você tem de ler uma quantidade enorme de textos em arquivos e sobretudo
para quem tem problema de garganta — eu vivia com amigdalite — é
muito cansativo. E tem o problema de memória, que com a idade começa
a falhar e você já não controla tanto os detalhes. Eles são importantes
para raciocinar sobre as grandes linhas. Se vem um detalhe que desfaz
seu raciocínio geral, o trabalho está perdido”.
400 ANOS DE MAURICIO DE NASSAU (1604-1679):
“Sou contra comemoração histórica, tenho horror, me recuso a participar
delas. É o tipo de coisa calhorda, porque na comemoração histórica
você comemora o presente, e não o passado, fazendo sim uma exploração
política do passado. De modo que tudo isso que vem de Nassau, eu
já anunciei que vou me dissociar. Não volto mais ao período holandês.
Nassau foi a personalidade que sintetizou a modernidade da experiência
holandesa no Brasil. Mas como essa experiência fracassou, ele se
tornou uma figura um pouco gratuita no conjunto da História brasileira,
porque teve começo mas não teve fim. Ficou no ar, solto. Realmente
a experiência holandesa foi um hiato de 24 anos. Nassau teria tido
grande significado, ainda hoje permanente, se a experiência holandesa
tivesse dado certo. Visto de hoje, ele encarnava a modernidade.
Era o representante do país que foi a primeira economia moderna
do Ocidente. Era um homem e militar de formação humanista. Enquanto
ele ficou aqui, a situação estava ruim, mas depois piorou, porque
houve guerra. Ele próprio reconhecia que a situação era insustentável.
Em todo caso, é uma grande figura simpática, simpaticíssima, da
História brasileira”.
MÉTODO: “Passei a me ocupar do assunto
muito por incentivo do José Guilherme Merquior (a quem ‘O negócio
do Brasil’ é dedicado) . O que eu pensava na época, e acho que com
razão, é que quando você pratica a História no começo da vida não
pode levantar muito o aspecto abstrato, epistemológico, porque isso
tem função inibidora. Só ao longo de muitos anos, no dia-a-dia da
pesquisa, você passa a se dar conta da precariedade do raciocínio
historiográfico. Mas se já começar a vida profissional como historiador
consciente dessa precariedade, você não faz nada. Isso lhe tolhe
a ambição de pesquisar e escrever. Comecei sem me interessar por
aspectos epistemológicos e simplesmente lia, que esta é a grande
escola do historiador. Não é fazer curso universitário, mas ler
os grandes historiadores. E eles não estão no Brasil, em geral”.
Caderno Prosa & Verso
O GLOBO
Rio de Janeiro
20/09/2003
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