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CINCO PERGUNTAS AO PENSADOR ANTONIO RISÉRIO

1. Querido Dom Riso; nos conhecemos no campo da poesia, lá nos anos 80 do século passado em Salvador. Poeta/pensador provocador parceiro de Waly Salomão, Rogério Duarte e Claudius Portugal; aliado dos concretistas na Bahia; co-editor da fantástica revista “Código” com o engenheiro Erthos Albino; autor de instigantes letras com Moraes Moreira e outros bambas; e com vários livros publicados no campo da poesia, como o “Fetiche”, programação visual do querido Resa; e o pioneiro e transcendental “Oriki Orixá”, época onde você começa a usar abertamente do “negromestiço” brasileiro. Aliás, vale lembrar também da sua participação efetiva como um dos editores da revista “Bric-a-Brac”, trazendo inúmeras contribuições magistrais, além de aproximar Arnaldo Antunes ao nosso projeto. Com o passar do tempo, você foi se transformando num pensador-formulador de propostas de releituras do Brasil. A lista de trabalhos e livros é enorme. Pergunta: o poeta que conheci lá atrás continua vivo em você? Ou sua mudança para Itaparica e seu afastamento da proposta política petista, com o romance “Que você é esse?”, o fez voltar-se totalmente para o pensar e o redescobrir um outro Brasil, em novo patamar bem mais sólido, a exemplo do que aconteceu com João Ubaldo ao escrever “Viva o Povo Brasileiro”? Como foi esse percurso e como funciona essa dialética para você?

AR: Essas coisas não se sucedem no tempo, é tudo simultâneo. Nos meus 14 a 15 anos de idade, eu tanto escrevia poemas quanto pretendia mudar o Brasil, militava pela transformação social do país, mesmo que de um ângulo equivocado. Da mesma forma, ainda bem jovem, quando fui morar em São Paulo e mantive uma relação intensa com os poetas concretos, eu já tinha lido todos aqueles textos escritos em nossos primeiros dias coloniais (Staden, Léry, Gândavo, Pero Lopes de Sousa, Thevet, Barleus, etc., etc.). E nunca me limitei a estudar realidades e heranças europeias. Pelo contrário, eu lia tudo o que encontrava sobre índios. Sempre estudei a África, a presença negroafricana no Brasil, essas coisas. Agora, comecei a discutir as coisas a partir da cultura. Quando publiquei o livro “Caymmi: Uma Utopia de Lugar”, o velho Caymmi me telefonou e foi logo dizendo assim: “Este seu criado aqui agradece as palavras que você disse dele. Mas eu sei que fui só o pretexto: seu livro é sobre a Bahia”. Ele até usou uma imagem bonita, disse que eu escrevia como se estivesse tecendo uma renda e ia envolvendo as coisas, de modo que o tema acabava sendo a Bahia, não ele. Do mesmo modo, foi por esse caminho que fiz a crítica do pensamento vigente sobre a nossa cultura, os índios, os negros. “Textos e Tribos”, que hoje é considerado um livro pioneiro, era um repensamento antropológico do conceito de literatura brasileira. “Oriki Orixá” foi um prolongamento disso, com o foco centrado na África, na vida e na cultura iorubanas. Eu sempre quis saber tudo sobre o Brasil, inclusive no plano das migrações secundárias, estudando italianos, árabes, japoneses, alemães no sul do país, etc. Aliás, as pessoas nem se lembram de que italianos migraram para a Bahia, não foi só para São Paulo. Dois dos baianos mais ilustres são descendentes de italianos: Marighella e Caymmi. As pessoas sacavam o lance. Com “Textos e Tribos”, vi que foi essa leitura que fizeram Florestan Fernandes e Darcy Ribeiro. Florestan até me escreveu uma cartinha sobre o livro, que guardo comigo até hoje. Agora, aos poucos eu fui abrindo o foco, deixei de me restringir à dimensão cultural. Isso aconteceu mais quando eu me mudei de volta de Brasília para a Bahia. Escrevi então “Uma História da Cidade da Bahia” e fiz argumentos e roteiros para a adaptação do livro de Darcy para o cinema, “O Povo Brasileiro”. E também, com o passar dos anos, eu fui conhecendo melhor as coisas. Quando publiquei “A Utopia Brasileira e os Movimentos Negros”, eu já tinha mergulhado fundo nesse meu processo de repensamento do Brasil. E fui adiante, com o livro “A Cidade no Brasil”, que, como quase tudo que faço, é um trabalho histórico-antropológico. Isso tudo é anterior à minha mudança para Itaparica. Eu sempre quis morar na ilha, mas demorei anos para convencer Sara Victoria. Até que uma crise financeira me ajudou. Eu tinha já rompido com o lance do marketing eleitoral (não existe marketing político entre nós, desde o começo do século 21: assim como não existem partidos políticos, mas partidos eleitorais) e do PT. Com isso, as portas se fecharam para mim – o PT, hoje, manda na Bahia quase tanto quanto Antonio Carlos Magalhães mandou, ou mais. E eles jogaram duro comigo, forçando até minha demissão de um jornal baiano (o governo petista pediu minha cabeça). Complicaram minha sobrevivência. Daí ficou mais fácil Sara Victoria aceitar a ideia de morar em Itaparica. Para mim, tinha esse motivo, mas, principalmente, tinha a minha vontade de sair de Salvador. Eu queria viver num lugar mais calmo, sem engarrafamento no trânsito, bom de andar a pé, conversar na pracinha, essas coisas. E continuei, é claro, a pensar e repensar o Brasil. Itaparica ajuda, sim, porque aqui não sou obrigado a ter vida mundana. Não tem vernissage, lançamento de livro ou de filme, nada disso. Não temos sequer uma banca de revista. Então, para mim, ficou tudo mais concentrado. E muita gente pensou o Brasil daqui ou a partir daqui. De José de Anchieta, que viveu aqui no século 16, a meu muito querido amigo João Ubaldo, que uma vez me disse uma frase que me deixou orgulhosíssimo: “Você é insuportavelmente inteligente”. Até Antonio Vieira fez sermão aqui. E foi na matriz de Itaparica que batizaram Luiz Gama, poeta e líder abolicionista. Isso tudo é muito bom, estimula o questionamento e o aprofundamento das coisas.

2.   Logo no início dessa pandemia, a partir do seu bunker/lar em Itaparica, na companhia de Sara Victoria, você nos apresentava, via Facebook, um delicioso diário de fatos e coisas que estava fazendo/pensando. De repente, como uma pedra no caminho, surge a proposta para demolir e reconstruir um novo conceito de nação. Pela palestra apresentada em março na Academia Brasileira de Letras (ABL), já anunciando o seu livro “Em Busca da Nação” que é um prosseguimento de pensares e livros anteriores. Confirma isso? E agora, o que vem mais pela frente?

AR: Primeiro, deixe eu sublinhar vivamente uma coisa. Eu não estaria fazendo nada em Itaparica se não fosse Sara Victoria. Ela escolheu o lugar, a rua onde a gente mora. Fez o projeto da casa e comandou as obras, para surpresa de pedreiros machistas que ficavam impressionados com o conhecimento que ela tinha das coisas. Na verdade, quando comecei a namorar Sara, eu também fiquei surpreso. Foi minha primeira namorada que, além de estojos de maquiagem, joias, etc., tinha uma tremenda caixa de ferramentas. Ela sabe fazer tudo. Pintou os azulejos da casa, desenhou móveis, fez cimento queimado – é impressionante. Eu costumo dizer que não me casei com uma mulher, mas com uma equipe. Agora, a história desse livro, “Em Busca da Nação”, é a seguinte. Eu já tinha alguns textos inéditos nessa direção, escritos ao longo dos anos. Capítulos como o da discussão inicial da noção de nação e a discussão da questão da identidade, por exemplo, foram textos escritos em 2003. Eu reescrevi algumas coisas, matizando a análise e tal. Mas essas coisas sempre estiveram em minha cabeça (eu ia até dar um curso sobre o assunto, no começo da década de 2010, mas ninguém na Bahia se interessou, não apareceram alunos). Mas anos depois publiquei um artigo no Estadão, com o título “Em Busca da Nação Perdida”. Daí, a escritora Ana Maria Machado me convidou para abrir o ciclo anual de conferências da Academia Brasileira de Letras. E eu então apresentei uma versão mais desenvolvida e aprofundada do artigo. Foi essa a conferência a que você assistiu aí no Rio. A repercussão, como a do artigo, foi muito boa. As pessoas falavam comigo como se aquela minha posição fosse aguardada, alguém tinha que abrir a discussão, etc. Ouvi isso de muita gente: Antonio Cícero, Peter Fry, Marco Aurélio Nogueira, Pedro Novis, Yvonne Maggie, etc. Daí, eu já voltei do Rio para Itaparica com a ideia do livro na cabeça. Juntei todos os meus rascunhos sobre o assunto. E mergulhei na escrita. Meu objetivo era claro: repensar a experiência nacional brasileira, no sentido de contribuir para alguma espécie de reinvenção da nação. Era preciso dar um chega-pra-lá na ideologia historiográfica hoje dominante, que promoveu uma espécie de avacalhação sistemática da história de nossa gente. Dar um chega-pra-lá no fragmentarismo identitário, no projeto neopentecostal para o Brasil, na polarização lulista-bolsonarista, etc., etc. Demolir lendas, fantasias e mentiras sobre o Brasil e o povo brasileiro. E, ao mesmo tempo, realçar alguns momentos e algumas coisas realmente importantes que fizemos. Me lembrava, aliás, dos 500 anos do Brasil, no ano 2000. As pessoas diziam: não há o que comemorar (é o velho e surrado masoquismo nacional, em toda a sua ignorância). Eu retrucava: como não há o que comemorar? Comemorar é co-memorar, isto é, lembrar junto, recordar coletivamente. E em meio século de existência histórica, a gente tinha criado um povo e um país – como não co-memorar isso? No livro “Em Busca da Nação”, bato pesado em muitos aspectos de nossa trajetória, mas ressalto coisas brilhantes e fundamentais que realizamos. Quer exemplos? Pense na preservação da integridade territorial e na construção da unidade nacional, no 14-Bis, no Parque do Xingu, na formação altamente criativa de uma variante sincrética e mestiça da língua portuguesa, no movimento abolicionista, na recriação mestiça do futebol. De Rondon e Santos Dumont a Pelé e Niemeyer, temos sim o que comemorar. É claro que temos crimes absurdos em nossa história – mas que país não os tem? Temos de aprender a denunciar esses crimes, mas também de anunciar onde realizamos coisas exemplares. É isso. Até porque, hoje em dia, só a direita mais reacionária assume as grandezas brasileiras, e isso não pode ser assim. Temos de repensar a experiência nacional até para poder assumir vigorosamente nosso legado democrático. Para ser acaciano, o Brasil hoje é o que nós (todos nós, sem exceção) fizemos dele – e o Brasil será o que nós, todos nós, fizermos dele daqui para a frente.

3.   Você tem um livro de poesia pronto que está nas mãos do editor Sergio Cohn. Foi escrito quando e que destino terá esse livro?

AR: Não, não está com Sérgio Cohn. Sérgio disse que queria editar minha poesia, mas depois não tocou mais no assunto. Ele não é tão disciplinado quanto o pai dele, um dos meus mestres, Gabriel Cohn, cujo livro mais recente, aliás, é um estudo de fato maravilhoso sobre Max Weber, que foi publicado na Alemanha... Eu reuni num volume todos os meus poemas que considero razoáveis (jogo fora a maioria das coisas que escrevo, porque tenho apreço pela qualidade e sei reconhecer quando o que produzo é apenas lixo), escritos entre 1974 e 2020. Dei o título trocadilhesco de “Outrossim”. Arnaldo Antunes escreveu a apresentação. Botei lá também um antigo poema do meu querido Paulo Leminski para mim, “Utopia para Riso” (Riso, como você sabe, é como amigos e amigas me chamam carinhosamente). E outro amigo maravilhoso, Sérgio Guerra, providenciou a artefinalização de tudo. O volume está pronto. Mandei para Zé Mario Pereira, editor da Topbooks, mas acho que ele não se animou muito. Zé Mario é o tipo do editor ao mesmo tempo lúcido e apaixonado, ele se entusiasma pelas coisas. Agora mesmo, está com outros trabalhos meus a caminho de publicar. Entre eles, uma alentada coletânea de ensaios que andam dispersos: “Quartzo Crescente – Escritos de Estética, História e Antropologia”, cuja apresentação vai ser escrita por José Miguel Wisnik, outro amigo querido. Mas o livro dos poemas parece não ter interessado a Zé Mario, que, aliás, era muito amigo de Darcy Ribeiro e José Guilherme Merquior. Mas vamos ver o que acontece.

4.   Você que pensa o mundo e a geopolítica brasileira globalmente, diga-nos o que pode mudar no Brasil após a vitória do Biden/Harris nos Estados Unidos? Vidas negras importantes lá e aqui? Ou são quintais diferentes? E a nossa milícia da Zona Oeste?

AR: Isso já tem sido muito bem examinado por diversos analistas. Eu não teria quase nada a acrescentar. Todos já falaram do isolamento do Brasil comandado por esse puto inconsequente que se plantou no governo: geopolítica, comércio, questão ambiental, etc. Ainda temos de temer o que arruaceiros como Trump e Bolsonaro podem aprontar. Não estamos livres de suas perversões paranoicas. E Bolsonaro é bronco: como alguém já disse, ele não consegue sequer escrever uma redação para o Enem. E somos nós que temos de desmantelar a República da Barra da Tijuca, suas milícias e seus sequazes, em todas as instâncias da vida brasileira. Fico impressionado com uma coisa, aliás: Bolsonaro e o PT, que disputaram a final da eleição presidencial de 2018, não vão conseguir eleger agora, nessas eleições municipais, nenhum prefeito das capitais brasileiras. Isso diz muito, claro. É um primeiro sinal de que poderemos tomar outro rumo, se o campo democrático brasileiro, esquecendo-se do PT e de seus satélites, estiver de fato disposto a dar um belo passo adiante. Bem, mas espero que a vitória de Biden ajude a retomada da vida democrática no planeta. Mais: a retomada da vida civilizada. Quanto ao resto de sua pergunta, eu não adjetivaria: vidas são importantes. Vidas de pretos miseráveis na África (“blacklivesmatter” é slogan perfeito para as favelas de Angola e da Nigéria, onde vemos o espetáculo cruel da exploração do negro pelo negro), vidas de homossexuais no mundo islâmico, vidas de brancos pobres nos Estados Unidos, vidas de índios no Brasil, etc., etc. Vamos voltar ao slogan proposto, há tempos, pelo mexicano Octavio Paz: vida agora.

5. Por último, solicito sempre aos participantes da micro entrevista que envie aos seus leitores um poema (ou texto) curto para sair ao lado da sua foto no facebook.

[Trecho inicial do poema “Via Pagu”]:

deus e o diabo
crias quase perfeitas
desejam o que desejo:
almas eleitas
    

* Entrevista de Antonio Risério, autor do livro “Em Busca da Nação” (Topbooks, 2020), ao poeta e jornalista Luis Turiba, fundador, em 1985, da revista de poesia experimental “Bric-a-Brac”, em Brasília.

Leia mais:

Antonio Risério: "É preciso recuperar o sentido de Nação"

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