| 'LULA NÃO É DE ESQUERDA, É 
              UM CONSERVADOR' Jornalista, que lançou livro sobre o ex-presidente, 
              diz que ele recusou proposta de Golbery de apoiar volta dos exilados.
 Silvia Amorim
 Observador privilegiado da ascensão do ex-presidente Lula, 
              desde os tempos de líder sindical, o jornalista e escritor 
              José Nêumanne Pinto defende em seu livro O que sei 
              de Lula (TOPBOOKS), lançado na semana passada, a desmistificação 
              do petista como revolucionário e representante da esquerda. 
              Considera Lula o maior político da história do país, 
              mas diz que, na essência, ele é um "conservadoraço".
 Nêumanne acompanhou, como repórter, 
              a rotina de Lula no tempo das greves no ABC paulista. Os dois foram 
              amigos, mas, com a eleição de Lula, a relação 
              acabou. – Sempre me rebelei com a imagem feita 
              ao longo do tempo e pensei: tenho o privilégio de conhecer 
              bem o assunto, a origem, a saga dele e o fato de ele nunca ter sido 
              revolucionário de esquerda. NÊUMANNE PINTO: "O Lula foi o primeiro cara que uniu 
              a esquerda, mesmo sem ser de esquerda"
 * * * Qual a maior revelação que o 
              livro traz? JOSÉ NÊUMANNE PINTO: É que 
              Lula não é de esquerda, é um conservador e 
              grande conciliador. O senhor questiona o mito em que ele se transformou. 
              O que o fez chegar a essa conclusão? NÊUMANNE: Isso não é uma 
              opinião. Eu mostro isso com episódios. Entre 1978 
              e 1979, eu fui procurado pelo Cláudio Lembo, presidente da 
              Arena na época, porque ele tinha uma missão. O general 
              Golbery do Couto e Silva queria fazer a volta dos exilados e queria 
              apoio do Lula. A reunião foi em um sítio do sindicato, 
              e lá eu ouvi o Lula dizer: "Doutor Cláudio, fala 
              para o general que eu não entro nessa porque eu quero que 
              esses caras se danem. Os caras estão lá tomando vinho 
              e vêm para cá mandar em nós?" O Lula falava 
              que a Igreja tinha dois mil anos de dívidas com a classe 
              trabalhadora e que não resolveria em dois anos. Com os estudantes, 
              dizia que poderia fazer um pacto: eles não encheriam o saco 
              do sindicato e o sindicato não encheria o deles. Isso tudo 
              eu vi, ninguém me contou. Ele é um conservadoraço. 
              Nunca foi revolucionário.  E a história dele com o PT? NÊUMANNE: Costumo usar a seguinte imagem 
              para ilustrar a história da esquerda na vida dele. Pense 
              numa cebola. O núcleo da cebola é o homem. O resto 
              é casca ideológica e política construída 
              ao longo do tempo. O meu objetivo era descascar essa cebola e chegar 
              ao homem, porque eu acho que o segredo do sucesso do Lula é 
              a condição humana dele, a origem, o ambiente familiar, 
              a carreira no sindicato e, sobretudo, dois talentos, que não 
              têm nada a ver com ideologia. O primeiro é o talento 
              que ele tem de se comunicar. O segundo é que Lula é 
              o maior de todos os conciliadores da história do Brasil. 
              O Lula conseguiu um milagre. Quando eu conheci o Lula, falava-se 
              muito que a esquerda brasileira só se reunia na cadeia, porque 
              eram todos inimigos. E o Lula foi o primeiro cara que uniu a esquerda, 
              mesmo sem ser de esquerda. Qual dessas características é, 
              em sua opinião, a responsável por torná-lo, 
              como o senhor diz, o maior político do Brasil? NÊUMANNE: Ele é o maior político 
              brasileiro e não considero isso, necessariamente, um elogio. 
              Você sabe o que é o político brasileiro? É 
              o cara que faz qualquer coisa para ficar no poder, e isso é 
              o Lula. A primeira vez que eu usei essa expressão, o (ex-governador 
              José) Serra me chamou e disse que Getulio Vargas era o maior 
              político que o país tivera. Falei: "Serra, o 
              Getulio meteu uma bala no peito por conta de uma corrupçãozinha 
              por causa de um segurança do pai dele. O Lula administrou 
              uma quadrilha chamada mensalão e a oposição 
              não tem um cara para enfrentá-lo na eleição. 
              Nunca houve um conciliador como Lula".  Isso foi aprendido ou é inato? NÊUMANNE: É inato e foi desenvolvido. 
              Quando conheci o Lula, ele não tinha noção 
              desses talentos. Nas primeiras entrevistas que fiz com ele, na época 
              do sindicato, ele era terrível, despreparado. Fui vendo, 
              aos poucos, ele se transformar num cara genial, no meu melhor entrevistado. 
              O talento de conciliador ele descobriu no bar da Tia Rosa, em frente 
              ao sindicato em São Bernardo do Campo, onde fazia as negociações 
              quando sindicalista. O PT que Lula fundou é a soma dos sindicalistas 
              autênticos, a Igreja progressista e a esquerda armada. Todos esses setores tinham como plano usá-lo 
              para chegar ao poder, mas foi ele quem acabou usando todos eles? NÊUMANNE: Defendo isso no livro. Primeiro, 
              o Golbery pensou que ia dominar o Lula. A Igreja tentou usá-lo, 
              mas, na primeira oportunidade, ele jogou a Igreja para escanteio 
              ao escolher José Alencar para vice, representante de um partido 
              evangélico. E o ex-ministro José Dirceu? NÊUMANNE. Lula usou o Zé Dirceu. 
              O PT era esfacelado, e o Lula não tinha domínio sobre 
              o PT. O Zé Dirceu é quem tinha e deu o domínio 
              a Lula. Na primeira chance que ele teve, despachou o Zé Dirceu. 
              Eu sempre achei que o projeto do Lula era o Palocci (ministro da 
              Fazenda na gestão Lula). O senhor diz que Lula não mudou tanto 
              nesses quase 40 anos. Em que ele continua o mesmo?
 NÊUMANNE: Apesar de dizer que é uma metamorfose ambulante, 
              ele não mudou. Usa os mesmos métodos. No palanque, 
              nos tempos do sindicalismo, a primeira coisa que aprendi foi o método 
              dele. Ele botava dois companheiros para defender teses diferentes: 
              um a favor de manter a greve e o outro contra. Ele olhava a reação 
              do povo e decidia. Esse é o cara que colocou Dirceu versus 
              Palocci. Ele governa na cizânia. Tem a sabedoria ancestral 
              de dividir para reinar. Um repórter da revista Playboy 
              perguntou a ele quais eram as duas maiores personalidades do século 
              XX. Ele disse Gandhi e Hitler. Um pacifista e um assassino. Isso 
              é ele.
 Acredita que ele voltará a disputar 
              a Presidência?   NÊUMANNE: Cada dia mais eu me convenço 
              de que esse é o plano dele. Há algo que o senhor sabe sobre Lula 
              e não está no livro? NÊUMANNE: Tem coisas que não posso 
              provar e, se escrevo, ou vou para a cadeia ou tomo um tiro.  O GLOBO30/08/2011
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