"COMO DEIXEI DE SER DEUS" PROVOCA
A SENSIBILIDADE DO LEITOR
Em busca de um Deus humanizado
Rogério Miranzelo *
O escritor mineiro Pedro Maciel lança
Como Deixei de Ser Deus (Topbooks, 2009), livro de frases
curtas, sempre numeradas, organizado para "ser" um romance.
O livro é aberto com uma chave que revela expertise autoral:
"O pensamento é o espírito do tempo". E
possui algumas metáforas de valor: "O sofrimento dos
poetas, artistas e dos santos torna-se o estrume espiritual da humanidade".
É um livro que permite leituras diversas, mas delineia a
busca por um Deus humanizado.
Se ao invés de definir o livro como "romance"
o autor tivesse anunciado a criação de um novo gênero
literário, embora não seja esse o caso, teria dado
menos trabalho a este resenhista na busca de elucidar a obra, e
evitado que Antonio Cícero gastasse quase a totalidade das
sete páginas de seu posfácio para tentar convencer,
a si próprio, de que se trata mesmo de um romance.
Com o livro anterior, A Hora dos Náufragos
(Bertrand Brasil, 2006), o autor obteve maior êxito em sua
proposta. As frases esparsas, nunca gratuitas, compõem de
fato um romance. Ou conto, já que pode ser lido em menos
de 20 minutos. Percebe-se mais claramente, no primeiro livro, uma
história, um personagem, e sabe-se de seu drama, a morte
que se avizinha. E há delírios líricos: "Pretendo
atravessar um grande mar parado. O sol me olha espantado" (pág.
119).
Já Como Deixei de Ser Deus parece
ter blocos mais estanques, que não permitem uma leitura tão
rápida. Todavia é um livro que provoca a sensibilidade
do leitor. Eu o definiria como livro de aforismos, ou de epigramas.
Os fragmentos, embora transitem por temas comuns, nem sempre se
intercomunicam ou se completam.
Há uma amplidão de significados:
"Tempo é a história da imagem e a memória
da paisagem. A memória sempre inventa esquecimentos".
Uma das conjecturas possíveis, dentre tantas, é a
de que o ser humano, embora tenha construído o registro de
imagens através do cinema, da fotografia e da pintura, é
precedido, alcançado e ultrapassado pelo tempo, este, sim,
verdadeiro construtor de imagens, independentemente de quem as possa
contemplar. Como se, mesmo perdida, no tempo se desenhasse "a
memória da paisagem".
* Rogério Miranzelo é
escritor e jornalista.
jornal O TEMPO
Minas Gerais
14/11/2009
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